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23 de junho de 2015

Angola - Direitos Humanos e Democracia interessam a Portugal 


         Por Ana Gomes

"Em 28 de maio de 2015, o tribunal provincial de Luanda condenou o corajoso jornalista Rafael Marques a seis meses de prisão, com pena suspensa por dois anos, pelo livro "Diamantes de Sangue" - que teve de publicar em Portugal porque nenhuma editora angolana aceitou publicar denúncias de corrupção e de violações de direitos humanos contra generais do poder.
Dois meses antes, a 14 de Março,  o ativista de direitos humanos José Marcos Mavungo e o advogado Arão Bula Tempo foram detidos em Cabinda, por organização de uma manifestação pacífica no enclave, conhecido pela riqueza petrolífera. Foram acusados da prática de crimes contra a segurança do Estado e o primeiro continua preso. 
No mês seguinte, em Abril, centenas de pessoas foram mortas durante uma incursão da polícia no Monte Sumi, na província do Huambo, contra os seguidores do líder da seita religiosa "Luz do Mundo", José Kalupeteka. A polícia só confirmou a morte de 7 pessoas, mas há imagens horríficas do massacre, que não ter despoletou qualquer investigação por parte do Estado angolano. Há relatos de que a polícia continua atrás dos sobreviventes, incluindo em clínicas e hospitais, para os silenciar definitivamente. Só uma investigação internacional independente poderá apurar o que efectivamente se passou e se está a passar. Recentemente eu e mais 36 eurodeputados escrevemos uma carta ao Presidente José Eduardo dos Santos instando Angola a aceitar essa investigação internacional.
No passado fim de semana, a Polícia angolana prendeu treze ativistas pró-democracia que estavam reunidos em Luanda,  entre os quais Nito Alves, que já tinha sido preso por alegado ultraje ao Presidente em 2013.  Cada um dos presos foi posteriormente levado, algemado, à sua residência, e foi apreendido material eletrónico, pessoal e profissional, sem qualquer mandado de captura. Não se sabe ainda onde estarão alguns dos detidos.
Há mais de 200.000 portugueses a trabalhar em Angola, muitos forçados a emigrar pelas políticas desastrosas deste Governo, muitos por isso inclinados a não ver, não ouvir e, sobretudo, a estar calados sobre os desmandos que vêm praticar em Angola, alguns coniventes na prática de crimes de corrupção espoliadora do povo angolano. 
Preocupo-me com os portugueses em Angola: não quero mais ver, como vi em 74/75, compatriotas voltar em aflição, só com a roupa que tinham no corpo. Ora, quando chegar a hora da sucessão do actual Presidente, pode haver "maka" da grossa, vindo a sobrar para portugueses a jeito, com destaque para os vistos como coniventes.
Por isso, convinha que Portugal atentasse e falasse. 
Não conto com este Governo sequer para lembrar que Angola é parceiro da União Europeia ao abrigo do Acordo de Cotonou, com diálogo político reforçado, incluindo obrigações e compromissos de direitos humanos e princípios democráticos que são para  ser respeitados. Não conto com um Governo incapaz de defender os interesses financeiros portugueses da roubalheira através do sistema angolano, como aconteceu no BESA e não só.
Cada vez, confesso, conto menos com a imprensa - sei como o controlo económico dos media portugueses por interesses angolanos visa obrigá-los a silenciar. E por isso presto tributo aos jornalistas e aos media que não se intimidam e publicam, como hoje o Jornal "Público" noticia as mais recentes prisões.
Conto, sobretudo, com os portugueses com memória, com vergonha e com sentido de solidariedade para com o povo angolano. Conto com a capacidade deles para romper o cerco, para denunciar e pressionar, designadamente através das redes sociais. 
O aumento da repressão política e policial e do assédio judicial contra os angolanos em nada pode  servir os interesses de Portugal, das empresas portuguesas e dos milhares de portugueses a viver e trabalhar em Angola".

(Minha crónica de hoje no Conselho Superior, ANTENA 1)


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